"SOCORRO!"
1915
Você demorou muito para achar? ― perguntou a pequena senhora com o sorriso torcido. ― Claro que eu sabia que você acabaria achando. Mas precisávamos de tempo. Quanto tempo demorou? ― Marco mudou de posição para sair debaixo do toque da mão dela. Isso foi feito calmamente, mas havia um desdém em sua face jovem que a fez estremecer embora ela fingiu encolhendo os ombros divertidamente.
― Você se recusa a responder? ― ela ridicularizou.
― Eu me recuso.
E naquele exato momento ele viu na curva do corredor o Chanceler e sua filha aproximando-se lentamente. Eles estavam voltando para o camarote. Será que iria perdê-los? Será? A velha mão fora colocada em seu ombro de novo, mas desta vez ele sentiu que agarrava firmemente.
― Menino malcriado! ― a voz estridente disse. ― Eu vou levá-lo para casa comigo. Se você se debater eu vou dizer a essas pessoas que você é meu neto mau que está aqui sem permissão. O que você vai responder? Meu filho está descendo a escadaria e vai me ajudar. Está vendo? E de fato apareceu na multidão no alto da escadaria a figura do homem que ele se lembrava.
Ele viu. Uma umidade surgiu nas palmas de suas mãos. Se ela tivesse essa audácia, o que ele poderia dizer àqueles a quem ela contasse a mentira? Como poderia ele provar ou explicar quem era – e quanto da verdade ousaria contar? Seu protesto e sua luta iriam meramente entreter os espectadores, que veriam neles apenas o temperamento imprestável de um menino rebelde.
Ele não fez nenhum som, e a mulher que o segurava viu apenas uma chama saltar debaixo de suas sobrancelhas pretas e densas.
O Chanceler se aproximava. Talvez! Deveria ele…? ― Você é muito orgulhoso para chutar e gritar. ― a voz continuou. ― E as pessoas iriam apenas rir. Está vendo?
As escadas estavam cheias e o homem que estava lá em cima podia somente se mover devagar. Mas ele vira o menino.
Marco virou-se para que pudesse ver quem o capturava de frente como se estivesse para dizer algo para respondê-la. Mas não estava.
Mesmo ao fazer o movimento de se virar, ele sabia o que deveria fazer. E podia fazer duas coisas de uma vez: salvar-se e dar o Sinal. Porque, uma vez dado o Sinal, o Chanceler entenderia.
― Ele estará aqui em um instante. Ele reconheceu você. ― a mulher disse.
Enquanto ele olhava para as escadas, o aperto delicado da mão dela inconscientemente afrouxou-se. Marco se livrou dela com um giro rápido. O sino tocou, o que avisava aos espectadores que deveriam retornar aos assentos, e ele viu o Chanceler apressar o passo.
Um momento depois, o velho aristocrata encontrou-se olhando surpreendido para a face pálida de um menino sem fôlego que falava com ele em alemão de tal modo que não pode fazer nada a não ser parar e ouvir.
― Senhor, ― ele estava dizendo. ― a mulher de violeta ao pé da escada é uma espiã. Ela me pôs em uma armadilha uma vez e ameaça fazer de novo. Senhor, posso implorar que me proteja?
Ele disse em voz baixa e rapidamente. Ninguém mais podia ouvir suas palavras.
― O quê! O quê! ― o Chanceler exclamou.
E então, aproximando-se um passo e tão baixo e rapidamente quanto antes mas com perfeita clareza, Marco pronunciou quatro palavras: ― A Lâmpada está acesa.
Seu apelo por ajuda foi atendido imediatamente. Marco viu isso instantaneamente nos olhos do velho, apesar do fato de ele ter se virado para olhar a mulher ao pé da escadaria, como se ela era seu único interesse.
― O quê! O quê! ― ele disse novamente, e fez um movimento na direção dela, puxando seu grande bigode com uma mão feroz.
Então Marco percebeu que uma coisa interessante aconteceu. A senhora idosa viu o movimento e o bigode cinza, e naquele instante seu sorriso sumiu e ela ficou branca, tão branca que, debaixo da luz elétrica brilhante ela estava quase verde e mal parecia viva. Ela fez um sinal para seu filho na escadaria e deslizou para dentro da multidão como uma enguia. Ela era uma mulher magra mas resistente e flexível e nunca houve um desaparecimento mais notável por sua rapidez. Entre esposas corpulentas e maridos altos ou robustos e famílias ela encontrou seu caminho e se perdeu – mas sempre indo na direção da saída. Em dois minutos não havia sinal de suas roupagens violetas. Ela se fora e também, evidentemente, se fora seu filho.
Estava claro para Marco que seguir a profissão de espião não era de modo algum uma coisa segura. O Chanceler a reconhecera e ela reconhecera o Chanceler, que se virou com aparência ferozmente zangada e falou para um de seus jovens oficiais.
― Ela e seu filho são Russos – dois dos espiões mais perigosos da Europa. O que eles queriam deste rapaz inocente eu não pretendo saber. Ela ameaçou fazer o quê? ― disse para Marco.
Marco estava se sentindo um tanto frio e doente e perdera sua cor saudável no momento.
― Ela disse que ia me levar para a casa dela e que fingiria que eu era seu neto que viera aqui sem permissão. ― ele respondeu. ― Ela acha que eu sei alguma coisa que não sei. ― Ele fez uma reverência hesitante porém agradável. ― O terceiro ato, senhor – não devo detê-lo. Obrigado! Obrigado!
O Chanceler dirigiu-se à porta de entrada dos assentos do balcão, mas fez isso com sua mão no ombro de Marco.
― Cuide para que ele chegue em casa seguramente. ― ele disse para o jovem oficial que frequentemente o acompanhava. ― Envie um mensageiro com ele. Ele é muito jovem para ser atacado por criaturas daquele tipo.
O oficial era um camponês Bávaro jovem e quieto, e parecia não ter curiosidade, nem mesmo qualquer interesse na razão da ordem dada a ele. Ele mal olhou para o menino que deveria escoltar. Ele nem sabia nem se perguntou o porquê.
O Rato adormecera sobre seus papéis e sua cabeça estava deitada nos seus braços dobrados na mesa. Mas foi acordado pela entrada de Marco no quarto e sentou-se piscando os olhos no esforço para abri-los.
― Você o viu? Chegou perto o suficiente? ― ele falou sonolento.
― Sim. ― Marco respondeu. ― Cheguei perto o suficiente.
O Rato sentou-se ereto repentinamente.
― Não foi fácil. ― ele exclamou. ― Tenho certeza de que alguma coisa aconteceu – alguma coisa deu errado.
― Alguma coisa por pouco deu errado – por MUITO pouco. ― respondeu Marco. Mas enquanto falava tirou o esboço do Chanceler da abertura em sua manga e rasgou e queimou-o com um fósforo. ― Mas eu consegui chegar perto o suficiente. E já foram DOIS.
Eles conversaram por muito tempo, antes de irem dormir naquela noite. O Rato ficou pálido enquanto ouvia a história da mulher de violeta.
― Eu deveria ter ido com você! ― ele disse. ― Agora eu entendo. Um ajudante-de-campo deve sempre estar em serviço. Seria mais difícil para ela lidar com dois do que com um. Eu devo sempre estar por perto para observar, mesmo que não esteja junto com você. Se você não tivesse voltado – se você não tivesse voltado! ― Ele bateu suas mãos fechadas uma na outra ferozmente. ― O que eu faria!?
Quando Marco virou-se para ele da mesa perto da qual estava, pareceu-se com seu pai.
― Você continuaria com o Jogo enquanto pudesse. ― ele disse. ― Não poderia deixá-lo. Você se lembra dos lugares, e das faces, e do Sinal. Temos algum dinheiro; e quando acabasse, você poderia pedir esmola, como costumávamos fazer de conta que faríamos. Ainda não precisamos fazer isso; e é melhor guardarmos isso para lugares no interior e vilas. Mas você poderia fazer se fosse obrigado. O Jogo deveria continuar.
O Rato agarrou seu peito magro como se tivesse perdido a respiração.
― Sem você? ― ele ofegou. ― Sem você?
― Sim. ― disse Marco. ― E devemos pensar nisso, e planejar no caso de qualquer coisa como essa que possa acontecer.
Eles ouviram o som de passos fortes na escadaria, e, quando alcançou o patamar, parou à porta deles. Então ouve uma firme batida na porta.
Quando Marco abriu a porta, o jovem soldado que o escoltara do Teatro Hof estava de pé do lado de fora. Ele parecia tão desinteressado e impassível quanto antes, ao entregar um pequeno embrulho.
― Você deve ter deixado isso cair perto do seu assento na Ópera. ― ele disse. ― Fui encarregado de deixar isso nas suas próprias mãos. É sua mochila.
Depois que ele voltou ruidosamente com seus passos fortes pela escada, Marco e O Rato tomaram fôlego rapidamente ao mesmo tempo.
― Eu não tinha assento e não tinha mochila. ― Marco disse. ― Vamos abrir.
Dentro havia uma carteira de couro lisa e maleável. E dentro da carteira havia um papel, em cujo cabeçalho estavam as fotografias da senhora idosa e seu filho. Abaixo estavam algumas linhas que afirmavam que eles eram os velhos espiões, Paul e Eugenia Karovna, e que o portador deveria ser protegido contra eles. Estava assinado pelo Chefe da Polícia. Em uma folha separada estava escrita a seguinte instrução: “Carregue isso com você como uma proteção.”
― Isso é uma ajuda. ― O Rato disse. ― Vai nos proteger, mesmo em outro país!
Não havia lâmpada de rua para brilhar em suas janelas quando finalmente foram para a cama. Quando a cortina foi aberta, eles estavam mais perto do céu do que quando estiveram em Marylebone Road. A última coisa que cada um viu, quando foi dormir, foram as estrelas.